quinta-feira, 17 de junho de 2010

Famílias de Acolhimento de Crianças

Entrevista com a equipa de Acolhimento Familiar da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa

«Famílias de Acolhimento de Crianças»


O que é o Acolhimento Familiar?

O acolhimento familiar é uma medida de promoção e protecção de crianças, integrada no sistema de protecção legal em vigor e, como tal, aplicada pelas Comissões de Protecção de Crianças e Jovens ou pelos Tribunais. Tem como objectivo acolher temporariamente uma criança em situação de especial desprotecção ou vulnerabilidade, numa família seleccionada para o efeito, obedecendo a determinados requisitos dentro de um processo de selecção enquadrado por uma equipa técnica, que visa garantir, por um lado, a sua protecção e, por outro, o espaço necessário à estabilização da sua família natural enquanto esta não possa assumir as suas funções parentais.


As crianças passam a viver em casa das famílias de acolhimento?

Sim. As crianças que beneficiam da medida de acolhimento familiar passam a viver em casa da família de acolhimen­to, integrando este núcleo familiar, enquanto durar a impossibilidade de regresso à sua família natural. O objectivo, no entanto, é o de que a criança venha a reintegrar a sua família de origem, evitando a quebra de laços e ruptura familiar. Durante este período, a família de acolhimento é responsável por cuidar e educar a criança, apoiando-a e integrando-a igualmente nas diversas esferas da sua vida (escola, actividades de tempos livres, saúde, etc.).


Quem se pode candidatar?

Existem diversos requisitos que o candidato a família de acolhimento deve reunir, como por exemplo ter idade superior a 25 anos e inferior a 65, podendo ser pessoa singular ou casal, e, no caso da Santa Casa, por inerência à competência que possui para actuar na área geográfica da cidade de Lisboa, ser residente na cidade de Lisboa. Quem resida fora da cidade de Lisboa deve dirigir-se aos serviços da Segurança Social da sua área de residência.


As famílias de acolhimento passam por um processo de selecção?

Sim. Um dos factores que se reveste de especial importância nesta fase é a avaliação da motivação do candidato, uma vez que esta influencia fortemente o posicionamento do candidato face à função que deseja assumir e, deste modo, a qualidade da relação que estabelece com os outros intervenientes no processo (criança, família natural e Equipa Técnica), bem como a qualidade do contexto familiar que irá proporcionar à criança.

A família de acolhimento deverá ser capaz de colocar os seus recursos humanos, afectivos e materiais na protecção de uma criança que deles necessite, perspectivando-se como elemento activo na construção de uma sociedade mais solidária.

A selecção envolve diversos momentos, como a avaliação em contexto real através de visita domiciliária, entrevistas psicossociais, avaliação psicológica e, finalmente, formação. Entendemos que o processo de selecção é relativamente exigente, mas esse facto decorre, inevitavelmente, da responsabilidade e natureza das funções que a família de acolhimento deverá assumir.


Quais os apoios que as famílias de acolhimento beneficiam?

As famílias de acolhimento beneficiam de sessões de preparação e formação, atenção individualizada, intervenção técnica durante (e pós) o acolhimento da criança, apoio telefónico durante 24 horas por dia para situações de emergência, contactos com outras famílias de acolhimento para troca de experiências e direito a auferir uma retribuição mensal pelo serviço prestado e ainda a um subsídio para a manutenção por cada criança acolhida. Temos consciência de que ser família de acolhimento é exigente, pelo que o apoio durante 24h por dia é muito importante para que a família se sinta sempre acompanhada.


Qual a relação que se espera existir entre a família de acolhimento e a família natural da criança?

Como já referimos, um dos princípios inerentes ao Acolhimento Familiar é o da reintegração da criança no seio da sua família natural. Nesta medida, durante o acolhimento da criança devem ser promovidos contactos entre esta e a sua família, mantendo-se e desenvolvendo-se a qualidade da relação. Espera-se que a relação entre família de acolhimento e família natural vá evoluindo positivamente durante o período de acolhimento num processo em que a relação entre ambas se vai estreitando de forma a que tanto a família de acolhimento, como a família natural e, principalmente, a criança, sintam fazer todos parte de uma Equipa conjunta que trabalha para um objectivo comum – a protecção da criança. À medida que esta dinâmica relacional se vai construindo ao longo do acolhimento, também os contactos entre família de acolhimento e família natural vão sendo mais próximos e assentes num crescente sentimento de confiança mútua. Ressalvamos, contudo, que não é exigido à família de acolhimento um envolvimento no trabalho de capacitação da família natural, mas espera-se que contribua, e muito, para o fortalecimento da relação entre a criança e a sua família natural.


Que intervenção será realizada junto da família natural da criança?

Como já foi dito, um dos pressupostos da aplicação da medida de acolhimento familiar é a previsibilidade de retorno da criança ao seio da sua família natural. Assim, a intervenção a realizar junto desta reveste-se de grande importância e depende não só da equipa técnica, como também da rede social e familiar de apoio dinamizada a cooperar no processo. A família natural deve apresentar potencialidades para a mudança, catalisadas através de uma intervenção técnica para o desenvolvimento das suas capacidades, intervenção que se quer próxima e focalizada, através de um trabalho assente numa relação de confiança e de co-responsabilização entre técnicos e família.

Concretamente, esta intervenção visa o desenvolvimento das competências sociais, pessoais e parentais dos pais/cuidadores através da conjugação de esforços de todos os serviços, sustentados por um plano de intervenção. Concebe-se que o cumprimento deste plano de intervenção possa conduzir a família a um funcionamento mais saudável e, consequentemente, a uma melhoria da sua capacidade de garantir um enquadramento adequado ao desenvolvimento saudável da criança.


A criança acolhida e a família de acolhimento criam laços afectivos fortes. Não será a separação prejudicial?

Uma criança em acolhimento familiar passa a viver com uma família, a partilhar as suas rotinas, a contar com o seu apoio, afecto e disponibilidade para a ajudar e orientar no seu percurso de vida e no seu crescimento e desenvolvimento saudáveis - é desejável que se criem fortes laços afectivos já que é o afecto que permite crescer e ajudar a crescer e a criar ambientes e contextos protectores, seguros e saudáveis, necessários a estas crianças. Contudo, a Equipa Técnica tem a responsabilidade de intervir na adequação das expectativas de forma a que estas sejam o mais realistas possível. O objectivo que se pretende atingir é o de que as famílias acolhimento sejam famílias que colocam à disposição, das crianças que acolhem, o seu património humano e afectivo durante um determinado período de tempo. O contexto da família de acolhimento deve constituir-se como um espaço seguro e protector, meio privilegiado de crescimento e desenvolvimento destas crianças, que lhes garanta vivências positivas num clima de afectividade e fomente o desenvolvimento da confiança nas relações. A “separação” entre criança e família de acolhimento faz parte do processo de acolhimento familiar que, como já referimos, se quer temporário e transitório, sendo este processo devidamente preparado. O regresso da criança a casa apresenta-se como a última fase do programa de acolhimento familiar e, apesar de nesta fase se trabalharem os aspectos mais específicos do regresso (em período nunca inferior a um mês), a sua preparação deve iniciar-se desde o primeiro dia em que a criança é separada da sua família natural, já que quando o acolhimento se inicia todos os intervenientes têm a noção de que irá, um dia, cessar. Todas as intervenções com a criança, com a família natural e com a família de acolhimento devem procurar facilitar este retorno. Assim, a saída da criança da família de acolhimento deve ser devidamente preparada, promovendo-se a participação e o envolvimento da família de acolhimento, da família natural e da criança. Apesar de ser um momento difícil para todos os intervenientes no processo, decorrente dos estreitos laços afectivos que são estabelecidos, a “separação” pressupõe o retorno da criança à sua família natural, e, consequentemente, a concretização do objectivo do acolhimento familiar – acolher a criança temporariamente até que estejam reunidas as condições para o seu retorno à família natural. Por outro lado, a “separação” pode não implicar um corte definitivo, uma vez que a família de acolhimento pode continuar a manter contactos com a criança, mesmo depois de a criança ser reintegrada na sua família natural, pelo que, caso as partes desejem, o contacto entre família de acolhimento e criança não tem de cessar – é, aliás, promovido numa óptica de alargamento das redes de suporte social, tão importantes para o desenvolvimento saudável de crianças e famílias.


Para mais informações aceda a http://www.scml.pt/acolhimentofamiliardecriancas/




Entrevista Publicada com autorização da
Santa Casa da Misericórdia de Lisboa

Unidade de Comunicação e Imagem,
Cristina Vaz de Almeida